A Comissão de Saúde da Câmara dos Deputados realizou, nesta terça-feira (27), audiência pública para discutir a reforma do modelo obstétrico brasileiro. A audiência, que foi requerida pela deputada federal Ana Paula Lima (PT-SC), que saber a respeito dos desafios estruturais do modelo obstétrico no país, com destaca para a persistência de práticas de violência obstétrica, a medicalização excessiva dos partos, que na grande maioria das vezes acontecem sem base em evidências científicas, e a subutilização das enfermeiras obstetras e obstetrizes nos serviços de saúde.
“O Brasil segue com taxas inaceitáveis de mortalidade materna, que afetam desproporcionalmente mulheres negras, indígenas, periféricas e residentes de regiões com baixa cobertura de serviços especializados”, diz a deputada em seu requerimento.
A solicitação da audiência pública pela deputada, além de ser uma oportunidade para a discussão do tema, condiz também sua história pessoal, já que a mãe da parlamentar morreu durante o seu parto.
O debate se torna necessário, primeiro, porque amanhã, dia 28 de maio, se comemora o Dia Internacional de Luta pela Redução da Mortalidade Materna, e depois, porque no Brasil, cerca de 3 milhões de partos ocorrem por ano, sendo que desse total, cerca de 1,8 milhão é feito por meio de cesárea – desse total 870 mil seriam feitos sem necessidade. Os números se tornam um problema a ser debatido, já que a Organização Mundial de Saúde (OMS) determina que somente 15% dos partos realizados em um país seja feito de forma não natural.
Uma das convidadas da audiência pública foi a presidente da Rede pela Humanização do Parto e Nascimento (Rehuna), Daphne Rattner, que falou com o Poder Delas e destacou que o encontrou foi um “evento magnífico”, já que discutiu sobre um assunto que precisa ser modificado na cultura brasileira que utiliza de forma indiscriminada a prática da cesárea mesmo não havendo necessidade.

“Precisamos ter um cuidado que se apoie nas evidências científicas visando o bem-estar e a experiência positiva das pessoas que estão sendo cuidadas, as mulheres, o homem trans, o bebê, a acompanhante, que respeitem a cultura, que respeitem o processo fisiológico”, diz Rattner.
A presidente da Rehuna também lembra que a qualidade da assistência na hora do parto precisa mudar, já que há no país um “excesso de intervenções” cirúrgicas, e no que diz respeito ao modelo obstétrico brasileiro não é diferente.
“Peguemos, por exemplo, as cesarianas. Elas são excelentes quando você tem um risco de morte ou de algum problema mais sério para a mulher ou para o bebê. Mas utilizá-la sem critério gera e agrega risco ao paciente”, explica.
Conforme Rattner ressalta, o fato de haver o uso de anestesia para se fazer a cesárea, já torna o que poderia ser um ato natural, um atendimento complexo. “Acidente de anestesia acontecer com qualquer cirurgia”, afirma.
“Nós precisamos mudar o modelo, para um modelo que já se provou internacionalmente como efetivo, de qualidade, e, neste modelo, teremos toda uma equipe que trabalha de forma colaborativa visando o bem-estar de quem esta sendo cuidado”, defende Rattner.
Dentro dessa equipe, ela diz, estariam profissionais como enfermeiras obstétricas, parteiras, doulas e a utilização de partos domiciliares.
Dados do Ministério da Saúde mostram que 9 e cada 10 mortes maternas são evitáveis com acesso oportuno à cuidados maternos baseados em evidências. Só no período da pandemia de Covid-19, por exemplo, cerca de 3.030 mulheres morreram, em 2021, o que representou um aumento de 74% em relação ao ano de 2014.
Como possíveis soluções para o alto índice de mulheres que morrem durante o parto e a gravidez, está redução de mortalidade materna até 2027; a redução em 50% da mortalidade para mulheres pretas e indígenas até 2027; e obtenção do Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), da ONU, até 2030 – com 30 óbitos por 100 mil nascidos.